sábado, 4 de agosto de 2012

CHAVIN DE HUANTAR


Chavin é considerado um horizonte arqueológico, isto é, um complexo cultural ou, pelo menos, um estilo tendente para a unidade (apesar da irregualidade de suas manifestações) e difundido através de boa parte dos Andes centrais. Sua denominação provém da localidade de Chavin de Huantar, perto do Callejón de Huaylas. O complexo Chavin se manifesta na edificação de centros cerimoniais, mas é particularmente reconhecível através da iconografia.

Os motivos principais são constituídos por animais: águas, falcões, jaguares e pumas. As representações humanas sem "kennings" (comparações visuais, como por exemplo cobras = cabelos) são raras. As criaturas míticas características são o crocodilo-peixe, o deus sorridente e o deus dos cetros, sendo que a boca de felino, com grandes caninos, caracteriza os seres sobrenaturais.
O arqueólogo peruano Julio Tello estabeleceu datações ousadas para Chavin, que despertaram o interesse e a curiosidade da ciência. Significaria nada menos do que o florescimento de elevada civilização indígena em épocas muito remotas, paralelas a algumas das grandes culturas do Velho Mundo, ou seja, os hititas, a época do bronze, sarcófagos de pedra, os obeliscos, etc.

Chavin, como se sabe hoje, estendeu sua influência por toda a região andina, das nascentes do Amazonas ao Oceano Pacífico, da selva até a costa, onde é chamado "Chavin costeira", alcançando até as ilhas do Pacífico. Os Chachapóias, que no século XIV ou XV ofereceram férrea resistência ao inca Tupac Yupangui, habitavam o curso superior do Marañon. As ruínas de uma de suas cidades, na margem ocidental o Urubamba, remontam a dataa antiquíssimas. Com suas representações do jaguar, seus desenhos solares, seus túmulos cônicos, denotam a visível influência da cultura Chavin.

Desta velha cultura indígena restam, além das ruínas do templo perto da aldeia de Chavin de Huantar, inúmeros sítios arqueológicos onde os símbolos, ornamentos, cerâmica e divindades são elos de união presentes, visíveis e inegáveis com Chavin: as estátuas dos Chibcha, que ocupavam sobretudo a região perto de Bogotá e Funja, bem como os vales dos rios Magdalena, Cauca, Caqueta e Patia; a cerâmica de Chimbote, Pachacamac; os trabalhos de cobre do vale de Chicama; as plaquetas de ouro de Lambaiquie ou os símbolos da "Porta do Sol" de Tihuanaco; restos de um palácio encontrado em Moniquira, com grandes colunas de pedra; as estátuas e figuras humanas encontradas em San Augustin, na região das nascentes do rio Magdalena; a colossal figura de jaguar que Lopez encontrou em Neita, onde guardava a entrada de um túmulo, etc.

A que se deva tamanha difusão? A hipótese de um império Chavin foi abandonada. Tudo leva a crer que essa difusão deriva de um culto religioso que se estendeu através dos Andes centrais, mais pela conversão do que pela conquista. O ponto de origem do fenômeno é muito discutido. Para alguns, corresponderia a influências externas (olmeca, colombiana, equatoriana); segundo outra corrente, seria autóctone, nascido nos Andes centrais, de focos múltiplos ou em ponto determinado. Não se trata, com toda certeza, das costas centrais ou meridionais, nem do alto Hualaga, pois o elemento Chavin se reveste, nessas regiões, de caráter nitidamente intrusivo. Restam as possibilidades da costa Norte, da cordilheira e dos vales andinos da encosta atlântica. De qualquer forma, os diversos elementos do complexo Chavin são encontrados no próprio Peru anes de 1.000 a.C.: templos sobrelevados (Kotosh, Toril), escultura lítica (Cerro Sechin), estilo de cerâmica (norte), iconografia (desde o período pré-cerâmico).

O Templo de Chavin de Huantar, durante os numerosos séculos em que esteve em uso, fornece indicações preciosas sobre a evolução geral do fenômeno Chavin. Erroenamente denominado "Castillo", é constituído de numerosas construções, terraços e páticos edificados no decorrer de vários séculos.

A construção principal, em três andares, com cerca de 75 metros de comprimento, é um complexo formado por galerias e corredores subterrâneos, minúsculos recintos, escadarias e plataformas, provido de um genial sistema de ventilação. Inicialmente, o templo é um edificio em forma de U, de pedra talhada, centralizado em torno de uma escultura complexa - o "Lanzon". Deve ser contemporâneo de certos templos da costa centro-norte (Palka) e da cerâmica mais antiga de Chavin, de Chogoiape e Cupisnique Antigo (costa norte).



A religião parece basear-se no culto de um "deus sorridente", com dentes de jaguar, que se encontra representado no Lanzon: uma divindade atemorizadora, cujas mãos e pés erminam em garras; em sua cabeça, que tem uma boca larga e dentes caninos, vêem-se serpentes enrelaçadas; em cima,a figura é arrematada por uma forma de coluna ornada com caretas grotescas de animais.

Entre as demais obras líticas de Chavin, destacam-se a famosa "PEDRA RAIMONDI", encontrada por volta de 1870 pelo viajante Antonio Raimondi. A pedra raimondi é um gigantesco monólito verde. Representa um ser híbrido, metade homem, metade felino, cujo adorno de cabeça é constituído por serpentes e goelas abertas. A lousa alta e estreita tem, na extremidade inferior, uma estranha figura de difícil interpretação: corpo de homem, guarra de jaguar e cabeça híbrida - meio jaguar, meio touro pois em cornos. Faz lembrar o cruzamento de jaguar/homem/touro. Outra obra lítica é o chamado "OBELISCO", uma formação ainda mais complicada, constituída de homem, felino, pássaro, peixe e réptil.

Representações em recipientes e em rochas mostram que, na concepção religiosa do homem de Chavin, ocuparam lugar proeminente, além do jaguar, também as serpentes e os crocodilos. Aliás, seres híbridos homem/animal, adorados como divindades, existem em quase todas as culturas do mundo. Os diferentes estágios de transição entre homem e animal são frequentemente exteriorizados através de máscaras cúlticas (cerimoniais).

Em 1925, Julio Tello fez um outro achado sensacional, no sul do Peru, península de Paracas, perto da cidade portuária e Pisco: restos de uma cultura que floresceu durante cerca de 900 anos e cujo início aproximou por volta de 700 a.C. Denominou-se de "CULTURA PARACAS", resultante da fusão de fortes influências Chavin com elementos locais.

Em câmaras subterrâneas, Tello encontrou centenas de múmias envoltas em grossas camadas de finíssimos panejamentos, bordados ou enfeitados com outras refinadas ténicas; as cores continuam vivas como se os séculos não tivessem passado. Elas estavam em grandes cestos, em posição fetal; muitas apresentam sinais de trepanação, às vezes com incrustações de pequenas lâminas de ouro. Seus "mantos", extraordinários para não dizer perfeitos, espelham o fantástico universo de deuses e demônios, com seus seres híbridos: felinos, pássaros e serpentes.

No principio, a cultura Paracas apresenta visível influência de Chavin, sobretudo na representação da divindade felina. No entanto, após 500 a.C. surge uma nova religião, um culto de troféus, expresso na reprodução de cabeças humanas decapitadas. Pouco a pouco a cultura Paracas se desliga da influência de Chavin, desenvolve estilos puramente locais e integra novos elementos religiosos e iconográficos, provenientes da serra meridional.

Texto de Elizabeth Loibl

 

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