quinta-feira, 24 de dezembro de 2009

QHAPAC RAYMI - Solstício de Verão andino

Em ABYA-YALA (América Andina), a cosmovisão natural informa que a Terra e a vida dependem do SOL. Por isso, os solstícios e equinócios são as principais festividades.

De agosto a setembro os campos são arados. Assim, quando chegava o equinócio da primavera, a terra está nua; o solo mostra a cor da terra pura, cheia de sulcos, pronta para receber a semente. Acontece, então, o KOYA RAYMI – a Festa da Rainha, marcando o início do ano agrícola. Nessa festa, os homens cavam, enquanto as mulheres semeiam os grão, pedindo que Pachamama acolha suas sementes e que Inti, o Sol, ajude a obter boas colheitas.

Entre outubro e novembro, começam a surgir os primeiros brotos. As crianças e jovens são, então, encarregados de espantar os pássaros, enquanto as mulheres e mocinhas têm o encargo de manter as valas de irrigação desimpedidas. A principal preocupação neste período é proteger as plantas que começam a germinar.

Em dezembro, os andinos cuidam dos tenros pés de milho e plantam a coca – cujas folhas, quando mascadas, atuam como estimulador. E é nesse contexto que acontece o solstício de verão: a semente brotou do ventre da Terra, que a alimentou e, agora, é uma planta pequenina mas cheia de vida, beleza e fortaleza. E isso faz o povo festejar a NOVA VIDA: plantas, crianças e jovens são lembrados no festival de QHAPAC RAYMI – O GRANDE FESTIVAL DA NOVA VIDA.

O ritual do QHAPAC RAYMI, antigamente era celebrado com mais majestade que atualmente. Pois como se trata de uma festividade dedicada à continuação da vida, estava explicitamente dedicada às novas gerações, às crianças e particularmente aos jovens que, durante esse festival, passavam pelo Grande Ritual, tornando-se parte viva, ativa e sujeito da sociedade.

Durante o ritual, consagrava-se, também, os recém-nascidos e os adultos presenteavam as crianças com roupas e as ferramentas mais essenciais para que se tornem os CONTINUADORES, assim como lhes eram ensinados os valores e as danças típicas do povo. Desta forma, iam transmitindo de geração em geração o compromisso natural com a vida e com o clã.

Duas semanas antes do Qaphac Raymi, todas as regiões preparavam suas múmias, cobrindo-as com novos mantos coloridos e novas jóias. Os chefes de cada ayllu (clã) – acompanhado pelos nobres locais e por todos os rapazes púberes e mocinhas em menarca (eram chamadas de nustas) de seu clã –, as carregavam nas costas, em procissão solene, até Cusco, onde eram colocadas no INTIHUASI – Templo do Sol. O próprio Sapa Inca, vestido a rigor, as recebia com a devida reverência.

No dia do solstício, antes do alvorecer, cada chefe colocava sua múmia nas costas e, acompanhado apenas pelos nobres de sua região, as levava até a praça central de Cuzco – a Huacaypata, o coração da cidade e de todo o Tawantinsuyo. Ali, eram colocadas sobre um dossel de plumas, voltadas para o ponto onde o sol nasceria, e às suas costas ficavam o chefe e os nobres que a representavam. O Sapa Inca, vestindo uma túnica de lã de vicunha bordada de ouro e prata, com braceletes de ouro nos punhos e tornozelos e usando o llauto (coroa emblemática inca, insígnia da raça) sentava-se no tiyana (banco de ouro) para, junto com as múmias, esperar em silêncio, o aparecimento do PUNCHA INCA, o "Senhor do Dia": o Sol.

Logo que os primeiros raios acariciavam o cume das montanhas, o Inca se levantava à frente dos nobres e entoava o hino de Inti. Depois, sentava-se novamente no tiyana e os chefes dos clãs repetiam, em coro, o canto sagrado, cujo ritmo se acelerava à medida que o Sol se elevava no horizonte, ao mesmo tempo, inclinavam-se e levantavam-se alternativamente, de olhos fitos no astro que subia sobre os cumes.

Usando seu bracelete de ouro, o Sapa Inca fazia os raios de sol concentrarem-se sobre a palha de uma fogueira e, assim, acendia o fogo sagrado, que seria mantido por todo o ano, no Templo do Sol. Nessa fogueira, os servidores lançavam os lhamas e porquinhos-da-índia imolados.

Durante toda a manhã, duzentas Nustas (virgens) vinham trazendo cada uma um cântaro de uma bebida de fermentado de milho e um ramalhete de folhas de coca. Coroadas de flores, entravam em fila de cinco no adro em que se iam realizar os sacrifícios.

À tarde, efetuavam-se outras tantas cerimônias. Ao fim do dia, traziam pás de ouro e o Sapa Inca trabalhava a terra com uma delas. Depois dele, todos os chefes de clãs faziam o mesmo.

Ao se aproximar o entardecer, os cantos alegres eram substituídos por tristes e melancólicas melodias, enquanto o Sol desaparecia por trás da cordilheira. Os assistentes erguiam as mãos para o céu, em sinal de súplica e se prosternavam para adorar o astro evadido. Escoltadas pelos nobres, as múmias dos Incas, voltavam então para a Intihuasi.

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